sexta-feira, 3 de junho de 2011

A menina entrou na livraria com os olhos curiosos para as prateleiras.
Com um tictac que fazia barulho dentro de sua bolsa, pegou as balas e foi comendo uma a uma enquanto escolhia um livro.
Tinha um ar de inteligente.
Escolhia vários e sentava com as pernas cruzadas em frente a uma mesa.
Descartava.
Separava.
Mas uma coisa em especial chamou a minha atenção. Os olhos brilhantes enquanto passava sobre as linhas parecia confuso, perdido.
Cheguei perto e perguntei - Precisa de ajuda?
Ela disse em bom som - Não, muito obrigada, estou só escolhendo.. um livro que me tire dessa agonia.
Na sua pilha tinham exemplares de Cecilia Meireles, Lygia Fagundes. Apenas mulheres.
Talvez ela tenha percebido como é dificil ser mulher nos tempos atuais. E ver ela buscar uma ajuda assim, em livros, me encantou.
Parecia tão sozinha e feliz com aquela solidão, que para ela.. com ela mesma, nunca ficaria realmente sozinha. E os livros sempre iam a acompanhar.
Quando ela veio até o caixa, reparei que todas mulheres foram descartadas de sua lista de livros. E ela adquiria um livro de Eduardo Galeano - Mulheres. Boa escolha.
Quem melhor pra dizer sobre como foi mais dificil e como aguentavam as mulheres doque ele?
Um livro de 1997, um ano vulgar que começa numa quarta-feira.
Ela simplesmente repetiu para mim um trecho de um dos contos do livro,como se fossêmos amigos:

'Todo o tempo mudas, Flora e Sery, enquanto os soldados lhe perguntavam onde se escondiam os negros fugitivos: elas olhavam o céu sem piscar, perseguindo nuvens maciças como montanhas que andavam lá no alto, à deriva.'

Excelente. Vou levar. Disse com a voz mais doce e satisfeita do dia.
Saiu com o livro na mão direita, para buscar o seu tão esperado conforto. Escrito há alguns anos atras por um escritor uruguaio que denunciava e entendia perfeitamente a opressão e exploração da America Latina para com as mulheres. E não só com elas...

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